O conselho de sexo da vovó | Do Amor #43
O incômodo compensava. Dividir uma cama de solteiro com a namorada tinha suas dificuldades e se movimentar livremente quando a luminosidade investia contra seu rosto no começo da manhã era, na certa, motivo para ganhar os já costumeiros beliscões na barriga ou na coxa. Mas ele sabia ser essa a única maneira de a coitadinha avisar um garotão de sono pesado que a velha máxima de dois corpos não ocuparem o mesmo lugar ao mesmo tempo era por demais verdadeira.
Só que o sexo era garantido e farto, dois adultos que até poucos meses eram crianças, mas a maioridade lhes deu aval para dirigir, beber e poder dormir na casa dela contanto que usassem camisinha. Estavam loucamente apaixonados e testavam todas as descobertas sexuais que viam juntos na Internet, além de passar as madrugadas tendo as melhores conversas de suas vidas até então. O que era um apertão ou dois quando se tinha a garota da sua vida nos braços?
O cheiro do bolo de canela e se instalou na casa todinha quando ele acordou. Esticou as pernas com modéstia para não ouvir reclamação, mas encontrou foi a cama vazia. O quarto em silêncio, a luz do banheiro apagada. Ela não tinha o hábito de sair sem ele. Na verdade, não se lembra nem de acordar alguma vez depois dela, que adorava preguiçar até a última gota de vadiagem na cama. Desceu as escadas curioso e encontrou sua namorada na cozinha, sentada e sem falar nada. Olhos baixos, mãos entre as pernas, os um pé escorado em cima do outro, os dois descalços. Na frente dela, a mesa do café da manhã posta e farta, com um lindo bolo de canela no centro, cortado a metade em fatias e fumegando aquele aroma ácido e picante.
Do outro lado da mesa, a avó dela.
Era uma senhorinha de olhar inocente e nariz roliço que adorava ir nos bailes da terceira idade para dançar e pintava os cabelos de roxo. A idade avançada parecia não acompanhar o pique dela, que zanzava a cidade inteirinha atrás de eventos e amigos. Mas, naquela manhã, ela estava lá para ser a velha conselheira.
“Mas por que vocês estão fazendo isso com vocês mesmos?”, interpelava em tom angustiado com as duas mãos secas e carquilhadas juntas como se orasse. “Bom dia, mocinho”, cumprimentou o garoto, “nós estávamos justamente esperando por você. “Sente-se aqui ao lado da minha netinha, sente-se”. E veio mais sermão.
“Vocês são tão novinhos, tão bonitos”. A vovó punha seu corpo para frente e para trás, quase que no embalo de uma cadeira de balanços imaginária. “No meu tempo a gente esperava mais, era preciso ter certeza absoluta do que se queria, se o amor era de verdade”. O casalzinho enamorado se entreolhou com pequeno descaso juvenil, uma altivez de quem crê no ultrapassar natural das gerações, como se a sexagenária na frente deles estava fadada às lembranças de um tempo que não mais acontece. Decidida, a menina ficou em pé e puxou o namorado pelo braço. “Vó, a senhora fala demais. Eu já disse que não adianta ficar enchendo o saco. A gente não usa mais essas regras bobas não. A gente vai se casar e pronto. A gente não quer tentar conhecer outras pessoas e nem transar com outras pessoas e nem experimentar o mundo lá fora e tudo o que ele tem a oferecer. Que nada, ficar esperando. A gente se ama! Vamos nos casar e acabou”.
Respondida, a vovó deu um longo suspiro e se recolheu. “Bom”, disse em voz baixinha, eu tentei.