A vida vivida

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Dizem que, se fizermos uma matemática simples, não minha especialidade, a soma de tudo o que é escrito atribuído a Homero, poeta épico da Grécia Antiga, não dá seu suposto tempo de vida. E não seria coisa pouca, mas bastante. Pegando tudo o que supostamente foi escrito por ele dá, facinho facinho, umas três vidas.

Na Idade Média, reza a lenda de que se vendiam, em igrejas, pequenos pedacinhos de ossos. Esses fragmentos seriam do fêmur de um burrinho que teria levado o menino Jesus de Nazaré para Belém no tão especial dia de seu nascimento. Mas o que acontece é que, se juntassem cada talhadinha da perna do burro, daria umas vinte e tantas patas. Só lá na região do centro-sul europeu. É muito osso e pouco membro.

Eu tenho uma amiga que tem um pouco disso. Seu eu tentar colocar cronologicamente todas as histórias que ela já contou não dá a vida dela e se eu somar todas as pegadas que ela deu não dá nas estradas assentadas nesse mundão de meu deus. E nem falo de aventuras, grandes feitos, eventos notáveis. Simplesmente uma vida vivida. Trabalhou aqui e acolá. Lá também. Fez de tudo um pouco, conheceu quem tinha que conhecer e quem quis conhecer. Saiu e voltou, foi preenchendo os espaços com experiências. Daí a gente vai tendo uma história e duas, quatorze. Uma vida cheia.

Das três curiosidades que eu contei aqui em cima, a terceira mais me encanta pelos pés no chão. Não tem um final incrível como o do Homero e seus clássicos que serão para sempre lidos, lembrados, reinterpretados. Não tem o mesmo peso da grande farsa cristã medieval de contar uma coisa que, na verdade, é outra. A última tem a singularidade de ser tranquila. Viável. É abrir a porta e dar-se, relacionar-se, andar. Somam-se as histórias, formam-se as pegadas.

E fica para sempre.

Jader Pires