"É bom ser viado, né cara!" | Do Amor #189

Andava distraído de amor. Fui almoçar sozinho essa semana e, chegando no quilo, vazio. Peguei a comida sem pressa, escolhi um bom lugar. Uma beleza. Cinco minutos de refeição e o estabelecimento estava cheio, filas e mesas lotadas.

Comi rapidinho e tinha ainda a tarde toda pela frente. Resolvi, em vez de voltar direto para o trabalho, dar uma volta, curtir o ar gelado e arborizado aqui de Perdizes. Caminhei pelo quarteirão da Universidade, vi gente bonita e escutei as conversas juvenis, sempre boas para despertar uns sorrisos meus. Senti meus passos mais lentos, mais cadenciados, levinhos. Observava a movimentação das pessoas, o agitar-se buliçoso das árvores e o vento assobiando tranquilo lá no alto por entre os prédios. 

 Que gostosa a caminhada quase imperturbável em um ambiente delicioso assim. Cumprimentei o porteiro de um predinho antigo que tem lá perto, dei risadas com as crianças saindo da escolinha da esquina, inocentes, me lembrei até de quando peguei uma delas dando feliz halloween para o amiguinho mesmo já tendo passado um dia ou dois da data. Lindinhos.

Continuei minha andança botando um pouco mais de fé na humanidade, no mundo em si, restaurando mais do gosto pelas coisas boas da vida. Parado no cruzamento, eu era puro êxtase e contentamento. Percebi um carro que atravessaria, mas parou para que o outro pudesse fazê-lo. Aproveitei a deixa e atravessei também, quase flutuando. Eu era um cara de sorte que trombava o tempo todo com ótimas pessoas. O carro que nos deixou atravessar tinha um senhor quase careca, com dois tufos de cabelo cor de algodão em cima das orelhas. Ele avançou, mas com velocidade super controlada para que eu pudesse finalizar minha travessia.

Cruzamos olhares quando eu cheguei no meio da rua e o cumprimentei com um aceno de cabeça, sorridente. O amor falando em meu peito. Ao atravessar, ele finalmente acelerou e passou por mim. Ao fazê-lo, botou a cabeça para fora e gritou: "É bom ser viado, né cara!".

Eu levantei o braço e dei tchau pra ele, pensando "é! deve ser bem gostoso sim!". Mas eu tô achando que não era bem disso que ele estava falando.