Ela doce, ele escorpião | Do Amor #215

O cheiro do peito quando ele encostava o nariz nela era uma baunilha adamada, o dulçor no suor gotejando pescoço abaixo na mulher de sua vida. Descia o vestido dela preguiçoso, um cuidado de lavrador plantado no mato as roupas minúsculas que os ombros dela carregavam. Mas, na densa folhagem do quintal, nos fundos da casa dela, a nudez que ela vestia lhe deixava melhor, bem melhor. Santo. Não era a vergonha que lhe interessava, mas o caldo, os líquidos dela fazendo verter os mais puros fluidos dos olhos dele, choro de homem feito, sem acanhamento, porém maciço. Apoiava as gotas dos seios nas fragosas palmas de suas mãos, o marrom da pele dela, o verdor acachapante e seco nas costelas de adão recolhidas na proteção do trio de Jaracatiá, parrudos e amorosos. Se escondiam de lá de dentro deles para se verem, o pai sabia não, se soubesse, ã. Caparia.

Mas, acastelados no esgalho, despiam-se, contemplavam a intensa sinuosidade dos corpos, os pés descalços ao rés do chão úmido, terra que pouco depois espalharia-se nas coxas peludas dele, no colo despreocupado dela toda vez que a virava para que terminasse grosso em suas costas, fora, reluzia o amor deles até que ressecasse e insistisse por renovação, de novo, os dentes dele cravando pedidos indecorosos no lóbulo sem brincos da moça. A irmã ficou de arranjar um par, disse em juramento, dedos entrelaçados e tudo. Os joelhos apartavam as pernas para que mais liberdade fosse conferida aos dois, quase caindo, estrelas da manhã por entre os galhos retorcidos, o solo pelado, cascalhos e pedriscos fugindo arremessados, macetados no vai e também no vem, nas quedas do cinto, da baba daqueles dois.

"Maná, maná" dizia entre os lábios travados para não fazer ecoar o gozo, tapava a boca dele com o peito açucarado, maternava a pobre figura, a testa pelando, gotículas acumuladas nela e no nariz que aventava os mamilos antes de devorá-los, trazendo de volta a pequenina dor de amar o homem que jazia esporrado novamente em seus braços. Fazia carinho em seus cabelos, chumaços colados, pequenas e deformadas carambolas que saciavam a fome de amor que ela tinha por ele. Da fenda relaxada em sua embocadura agora saía poemas decorados, prova infantil porém segura dos encantos dele por ela, elogios pré-fabricados que traduziam o amor intenso, mas mal cuidado que ele tinha, solavancado por anos de uma virilidade imposta. Não dentro das árvores, nunca no jardim da fantasia deles, me enfia o dedo, ele contava com a coragem dela, ela protagonista dos pedidos dele, lhe metia de olhos abertos, buscava na escuridão daquele par de olhos animalescos a fragilidade, delicadeza que só o acesso irrestrito do amor poderia proporcionar.

Lambiam-se para limparem-se da insensatez. Levavam, cada um para a sua casa, o outro no vermelho caliginoso da língua. Ela, doce. Ele, escorpião. 

Jader Pires